Lockdown na infância

 Lockdown, a palavra se tornou conhecida e acabou por conta da pandemia entrando para os dicionários não só do brasileiro mas acabou virando uma dessas palavras mundializadas como “Coca-Cola” ou “OK”. Pior que a pronuncia para nós falantes do português é seu significado, confinamento, enclausuração, ato de se fechar dentro de um espaço geralmente por motivo maior, no nosso caso uma pandemia global.

Contudo um aspecto que desejo abordar é o confinamento da infância que como muitos estudiosos vem alertando vem se tornando um fator cronico em nossa sociedade hiperurbana, onde as pessoas a cada dia optam ou são forçadas a morar em locais cada vez mais diminutos com pouco ou nenhum contato com ambientes naturais, espaços ou mesmo áreas de lazer.

Quando um adulto se submete voluntária ou involuntariamente a esse processo os danos a sua saúde física e emocional já são considerável, agora quando falamos de crianças os danos costumam ser mais acentuados e acabam se prolongando para a vida adulta. Se já não sofrêssemos com os problemas da urbanização sem planejamento que costuma amontoar as pessoas no menor espaço possível para maximizar os lucros do setor imobiliário, sem considerar o acesso a ambientes naturais ou no mínimo arborizados. Com advento da Covid 19 e a real necessidade de um confinamento, a vida das crianças que habitam esses ambientes de intensa urbanização se tornou bem complicada, se antes as escola ofereciam pelo menos um escape nem por vezes adequado já que não são todas ou sendo realista a minoria das unidades escolares e cheches dispõem de um espaço natural propício as brincadeiras infantis saudáveis, mas, pelo menos, garantiam a mínima mobilidade e a chance de, pelo menos, algumas corridas, agora o confinamento em pequenas casas ou apartamentos com os parques e playgrounds fechados vem agravando de maneira cruel esse quadro. Algo que a princípio pensávamos ser temporário com essa “segunda onda” vem prolongando uma situação que já era preocupante.

O cotidiano brasileiro nas grandes cidades é a décadas uma situação que vem a cada dia se degradando, alicerçada em um modelo de ocupação desordenado característico de megalópoles do terceiro mundo, privaram pela maximização dos espaços e dos moradores em detrimento a qualidade de vida, ruas estreitas sem condições de arborização, praticamente ausência de áreas verdes públicas e quando existem são mau cuidadas ou sucumbiram a marginalidade impossibilitando o uso das famílias. Condomínios com diminutos espaços, dedicado as crianças e quando existem marcado pela artificialidade como brinquedos de plásticos ou metal, presença de grama sintética ou piso impermeável, quando não se encontram em locais internos como salões ou galpões cobertos.

Essa marca do afastamento da natureza se reproduz em dezenas de grandes cidades do mundo, mais tem suas características levadas ao extremo em países em desenvolvimento ou em nações muito pobres, cidades como Lagos na Nigéria, São Paulo, Bangkok na Tailândia ou Bombaim na Índia tiveram um explosivo crescimento demográfico a partir dos anos de 1960, motivado pelo crescente êxodo rural, tendo a grande parte dos seus bairros oriundos de assentamentos irregulares sem nenhum planejamento ou normas, o que ocasionou espaços mínimos para as habitações e a quase total falta de serviços públicos. Com o crescimento e a especulação imobiliária esse “apequenamento” das moradias começa a se transferir para a classe média que antes gozava de uma certa qualidade de vida com casas amplas e confortáveis em bairros planejados e com boa infra estrutura.

Chegamos ao século XXI com aproximadamente 55% da população mundial em áreas urbanas e no Brasil essa taxa é de 84,72% segundo Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2015.

É de grande urgência repensarmos a infância neste contexto, uma vez que as experiências de amplos quintais e ruas sossegadas não se aplicam as atuais gerações.

Segundo a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) aconselha que crianças e adolescentes passem pelo menos uma hora por dia fazendo atividades ao ar livre. O contato com a natureza está ligado a inúmeros benefícios como:

Facilita a socialização: Crianças ao brincarem com brincadeiras não dirigidas tendem a criar laços de convívio, testam regras sociais e se aprimoram em habilidades como dialogo, convencimento, perdão e tolerância.

Equilíbrio Mental: O contato com a natureza tende a diminuir os sintomas de problemas como o Transtorno do Deficit de Atenção (TDAH), estresse, fadiga e irritabilidade, melhorando a atenção.

Estimula os sentidos: Ao brincar em ambientes naturais a criança busca construir seu repertório de brincadeiras e brinquedos mediante ao que a natureza oferece, isso auxilia na criatividade e em elaborar estratégias para superação de desafios e conquista de objetivos.

Fonte natural de vitamina D: A exposição a luz solar é responsável pelo aumento de vitamina D no organismo.

Aprimoramento na coordenação motora: É inegável que crianças que brincam ao ar livre e tem a liberdade de se movimentar adquirem níveis mais elevados de consciência corporal, equilíbrio e agilidade. Além de terem sensível aumento na capacidade pulmonar e maior resistência a fadiga física e mental.

Aumento da capacidade imunológica: Já é sabido a décadas que a exposição de crianças a ambientes extremamente assépticos prejudica o fortalecimento do sistema imunológico nos primeiros anos de vida o que pode contribui para o aumento do caso de alergias e doenças respiratórias.

Infelizmente para nós simples cidadãos confinados nos cubículos dos apartamentos ou dos bairros populares assistindo seus filhos no atual contexto a serem privados (por razão maior) até mesmo do convívio escolar, nos resta aguardar para que nosso governo implemente a vacinação em larga escala e quando a vida voltar ao normal possamos discutir o destino das cidades e das nossas crianças neste contexto de concreto e asfalto.

Comentários

Postagens mais visitadas