A CRISE DO 6º ANO, UM DESAFIO CERCADO DE MEDOS CARÊNCIAS E LENDAS.....
Numa sociedade onde o “adolescente”
é tido pela mídia como fase da vida ideal, onde toda a liberdade da infância se
junta com os benefícios da autonomia da vida adulta. Cria-se então uma paranoia
social, alimentada diariamente pelos nosso “tão bem intencionados” meios de
comunicação”, numa ponta crianças se vestindo, consumindo e tentando agir como
um adolescente, na outra jovens tentando se vestir, consumir e agir também como
um. Ou seja crianças que não brincam e adultos que não crescem. Agora observem o moderno termo, a "pré-adolescência" ou seja um período da vida criado para espremer ainda mais a infância já tão apertada entre apartamentos e playgrounds e agora sem tempo de ser criança.
Mas onde todo
esse psicótico jogo ganha seu máximo ápice pedagógico se não na passagem do
primeiro ciclo do fundamental para o segundo, estágio onde ocorrem bruscas e
grandes rupturas, onde de repente a criança é jogada num mundo de grandes, no
caso da educação pública quando o João vira o nº 18.
Me inspirei a escrever esse
artigo depois que foliando um exemplar antigo da revista Família Cristã, encontrei
a seguinte matéria: ENTRE A INFÂNCIA E A
ADOLESCÊNCIA, A DIFÍCIL PASSAGEM PELA 5º SÉRIE, escrito pela professora da
UNESP hoje aposentada, Elisa de Oliveira Cesareti. Família Cristã, ano 55,
nº639, págs. de 24 a 26, março de 1989. Deixarei no fim do artigo a página scaneada
(não se acha na internet, até agora!!!), mesmo correndo o risco de infringir
leis de direitos autorais, vale a pena, pela abordagem sincera e sem os
malditos clichês sexualizantes da atualidade, o especialista consultado é ninguém
mais ninguém menos que nosso conhecidíssimo Içami Tiba que faz uma analise das
mudanças psíquicas e corporais em conjunto com as mudanças estruturais e pedagógicas
que a criança vai enfrentar. Não vou ficar a fazer resenha ou mostrar minha
opinião o que seria redundante já que vou deixar na integra o mesmo para que
cada um faça sua analise, prefiro atualizar o debate e rebater um pouco o lugar
comum que alguns tanto repetem como carpideiras a chorar por defunto alugado.
CARACTERIZANDO A CRIANÇA E O ADOLESCENTE
Isso é uma criança ou um pré pré adolescente? |
Nessa etapa da vida o ser
humano começa a passar por diversas mudanças relacionadas ao seu maturamento
sexual, contudo devemos levar em conta além dos fatores biológicos existem já
que eles existem o tempo todo, os fatores culturais que neste caso, pesam mais.
Analisando o caso pela ótica de Philippe
Áries em sua obra A Construção Social da
Infância, onde o historiador francês defende que infância e adolescência mais
do que fases orgânicas são constructos sociais, que em outras épocas elas não
existiam como hoje e que em muitas culturas se tem concepções muito diferentes
sobre a infância e mesmo postula a inexistência da adolescência entre muitos
povos. Áries defende que ao longo da
história ocidental a imagem da criança e todo seu inventario imagético se
formou a partir da revolução industrial, quando taxas de mortalidades infantil
declinarão, a vida urbana obrigou as famílias a terem menos filhos e
consequentemente investirem mais em sua criação e sobretudo quando a grande família
foi substituída pela família nuclear (pai, mãe e filhos).
A adolescência como conceito é
mais recente ganharia corpo a partir do pós guerra, principalmente nos fins dos
anos 50 quando a geração do Baby Bum, (como é conhecido a geração nascida no aumento
demográfico ocorrido sobretudo nos EUA, após a segunda guerra mundial) começa a
chegar a idade de maturidade sexual, o contexto econômico favorecia a família americana
uma vez que o país embora tenha participado da guerra não teve seu território
danificado e agora como grande economia era praticamente o motor da
reconstrução europeia, nisso as famílias estavam empregadas, o comércio e setor
de serviços aquecidos, renda em alta, os anos dourados, agora ao contrario da
geração de 1930 que teve que ser sacrificada na crise econômica de 1929 esse
jovem podia desfrutar de boas escolas, famílias seguras e economicamente fortes
que proporcionavam conforto, educação e acima de tudo tempo, já que esse jovem
não precisava trabalhar e com dinheiro de suas mesadas podia consumir e criar
seu estilo. O segmento se aprofundou nas décadas seguintes, nos anos 60 e 70
com as contestações politicas e apelo a liberdade sexual, uso de drogas e com
um estilo musical que se tornou a cara dos adolescente, o Rock´n Roll, logo ídolos
se firmaram como Os Beatles, Elvis e os imortais Rolling Stones, no cinema a
moda de consolida, gírias se firmam. Não demorou para que o mercado visse nesta
faixa etária um filão de consumo gigante, foi nos anos 60 que a publicidade dirigida
para os jovens tem seu inicio definitivo, a lambreta seu veículo, brilhantina
seu acessório e o Rock´n Roll sua trilha sonora.
Os anos subsequentes só
mostraram esse aprofundamento num segmento com alto desejo de compra, imaturidade
emocional e facilidade para ser moldado para o consumo destes ou daqueles
produtos. Embora os anos 60 tenham tremido com os movimentos jovens, as décadas
seguintes se mostraram favoráveis ao “amansamento” da juventude e chegamos ao
segundo decênio do século XXI com esse monstro consumista, precocemente sexualizado,
mas imaturamente incapaz de enfrentar os desafios da vida, sim nós temos ai o
adolescente. Não que esteja afirmando que todo jovem é uma besta selvagem no
cio que só se preocupa com sigo próprio e seus interesses de consumo supérfluo.
Mais sim o que a moderna sociedade vê e espera dele, o senso comum julga com
frases como: - Essa fase é difícil! - Adolescente é insuportável! Infelizmente,
por vezes tais afirmativas vem de quem por profissão escolheu educa-los, alguns
professores.
Cada ser humano é um ser de
individualidades, enquadrá-los em moldes é perder sua singularidade, é julgar
sem ver, ouvir e sentir. Nisso peca
nosso sistema educativo que trata o futuro como perdido enquanto ele ainda
desabrocha.
O 6º ANO, ENTRANDO NUMA FRIA....
É entrei no "ginásio" o negocio agora é sério!!! |
Se não bastasse a bagunça psicológica
e corporal que a criança começa a passar, pois tem início ai a puberdade,
justamente neste delicado momento a infeliz cai num sistema educacional
altamente segmentado, onde o foco sai de como elas aprendem para como melhor
distribuir conteúdo. Logo a figura do professor polivalente sai de cena para
dar lugar aos especialistas em cada disciplina, mas vejamos o que no contexto
atual da escola pública isso acarreta:
O professor com salários defasados
(não sei se algum dia teve a carreira docente bons salários ou essa é apenas
outra lenda) tem que acumular aulas, alunos e as malditas cadernetas, é um
sistema onde se é impossível levar em conta a individualidade e muito menos as necessidades
de aprendizagem. Salva-se quem já possui boas bases ou um intelecto invejável.
Juntando-se isso a salas abarrotadas, péssimas condições estruturais em muitas
escolas, aliando-se com as mazelas que nossa sociedade acarreta como violência,
drogas e racismo não é de se admirar que quando nossa criança realmente deixe
de ser criança e chegue ao ensino médio, metade desista da escolarização e só
vão concluir posteriormente o 2º grau, mais adiante, nos cursos supletivos. E o
que é pior somente 12% dos jovens entre 18 e 24 anos ingressam em uma
faculdade. E segundo o site da ABRAES
(Associação Brasileira de Estágios):
“Dados da última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2012, 18 milhões de pessoas entre 15 e 24 anos estão fora da escola e 1,8 milhão não cursam o ensino médio. Esse número representa 17,9% do total de talentos no Brasil. Entre 18 e 24 anos, fase de ingressar em uma universidade, mais de 14,6 milhões não estudam; ou seja, 64,8% do total nesta faixa etária.”
O Ensino Médio atualmente se divide entre, escolas deficitárias que “subformam” os alunos e centros de treinamento para vestibulares que é o que as grandes redes de escolas particulares se tornaram, tudo salpicado de pequenas e raras ilhas de excelência que caracterizam as escolas federais, sobretudo ligadas as Forças Armadas e centros pertencentes à Rede S (SENAI, SESC, SIESP e demais) ou outras raríssimas instituições públicas e privadas que heroicamente fazem com grande qualidade o ensino para jovens.
Isso não é a sede do MIT ou da Google, é uma escola de Ensino Médio de verdade, Sesc, Rio de Janeiro. |
Bom, isso acarretaria centenas de páginas, coisa que dispomos, mas a paciência do leitor não é para tanto:
Prefiro seguir a doutrina da Pedagogia Waldorf onde essa passagem do 5º para o 6º ano é atenuada e feita de maneira suave, nas escolas Waldorf os alunos permanecem com o mesmo professor, esse responsável pela maior parte das disciplinas até os 14 anos e não somente até os 10. A mudança é toda ritualizada com uma cerimonia bem sensível com a participação dos pais e demais responsáveis pela educação do aluno desde os 7 anos. Mesmo no ensino médio os alunos contam com um professor que funciona como o orientador da sala. Claro que a Pedagogia Waldorf é um sistema de ensino bem restrito e mesmo a despeito dos excelentes resultados, após cem anos de existência ele ainda é usado em poucas escolas pelo mundo e em raras unidades aqui no Brasil.
Mais Rudolf Steiner fundador das escolas Waldorf tem muito a ensinar ao atual modelo.
Acredito que a solução deveria começar na formação docente nas faculdades, hoje nossos licenciados saem com uma carga teórica digna de um bacharel em sua área, mais com pouco ou simbólicas horas dedicadas a como ensinar ou a conhecer os processos de como os alunos na faixa etária que irão lecionar se desenvolvem. Mesmo as grandes redes de ensino públicas não aprofundam a formação de seus docentes nestes temas.
Estruturalmente as salas deveriam ter número de alunos reduzido, as escolas não deveriam abrigar multidões de alunos como muitos prédios mastodônticos existentes por ai o fazem. Os docentes deveriam lecionar apenas em uma escola, estreitando o vinculo com sua comunidade e tendo um conhecimento longitudinal de seus pupilos.
As disciplinas até o segundo grau deveriam ser obrigatórias (ainda não estamos preparados para o modelo de Summerhill) mais aplicadas em módulos maiores que os 50 ou mesmo 150 minutos que as aulas atuais duram, módulos semanais ou mesmo mensais poderiam ser uma boa solução.
No Ensino Médio, deveriam ter um núcleo obrigatório mais matérias optativas que já iriam moldando o aluno segundo seu interesse artístico ou acadêmico a sua futura escolha profissional ou de curso superior.
Claro deveríamos ter escolas mais amplas, bibliotecas mais estruturadas, atividades artístico culturais em fartura e muitas viagens e vivencia em loco. “E não os caixotes de concreto que hoje abundam por ai!”
Uma escola que se respeita as fases pelo que seus alunos passem que não os tomem por estereótipos, que não tente tornar crianças em adolescentes e nem adolescentes em adultos precoces. Em fim uma escola que não expulse seu aluno devido a suas condições sociais e que professores tenham orgulho de lá lecionar e que os alunos certamente não abandonarão.
Por motivo de expaço coloquei a matéria da Revista Família Cristã na página ANEXOS do blog:
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